De olhos fechados
mergulho em teu ventre.
perfumes se encontram
no meu rosto. Braços
apanham meus cabelos.
Braços leves, pesados,
amorosos ou rudes,
Braços de cedro
ou espinheiro,
de parasitas
ou cravos selvagens.
No ar e na boca
um gosto de erva
amanhecida. Um gosto
de coisa lavada.
Um ar de chuva
e terra. Um gosto
de mundo amanhecendo.
Oh, enveredar
por esse mundo livre
e ser uma entre as árvores
que formam o volume
do teu rosto.
Enveredar por esse mundo livre.
Conhecer a geografia
do teu peito. Misturar-me
à conversa das folhas
e adivinhar o casamento
secreto das raízes!
Vim ao mundo em agosto
Sou triste de nascença e sem remédio.
Vim ao mundo no triste mês de agosto
o mês fatal das chuvas e do tédio,
e nasci quando o sol estava posto.
Vim ao mundo chorando... (o meu presságio!)
Um vento mau marcava na vidraça
o plangente compasso de um adágio,
anunciando agoirento uma desgraça.
Vim ao mundo no triste mês de agosto
o mês fatal das chuvas e do tédio,
e nasci quando o sol estava posto.
Vim ao mundo chorando... (o meu presságio!)
Um vento mau marcava na vidraça
o plangente compasso de um adágio,
anunciando agoirento uma desgraça.
Sou triste. É irremediável este mal.
E eu não quero curar minha tristeza.
Só ela para mim tem sido leal,
Na minha via-sacra de incerteza.
E eu não quero curar minha tristeza.
Só ela para mim tem sido leal,
Na minha via-sacra de incerteza.
Sou triste de nascença. É mal sem cura.
A vida não desfez meu nascimento.
Sou a menina triste e sem ventura,
que em agosto nasceu, com chuva e vento.
A vida não desfez meu nascimento.
Sou a menina triste e sem ventura,
que em agosto nasceu, com chuva e vento.
Grito
Minha voz nesse dia subirá.
E eu me erguerei também.
Solitária. Definida.
As portas adormecidas abrirão
passagem para o mundo
Meus sonhos, meus fantasmas,
meus exércitos derrotados,
sacudirão o silêncio de convenção
e as máscaras de piedade compungida.
Dispensarei as rosas, as violetas,
os absurdos véus sobre meu rosto.
Serei eu mesma. Estarei
inteira sobre a mesa.
As mãos vazias e crispadas,
os olhos acordados,
a boca vincada de amargor.
Não. Não irei sem grito.
Abram as portas adormecidas,
levantem as cortinas,
abaixem as vozes
e as máscaras —
que eu vou sair inteira.
Eu mesma. Solitária.
Definida.
Poesia
Toda a poesia do poema
não vale a outra – a verdadeira.
A que não consegue transpor
a face fria, que ficou ignorada.
A que não pode ser desprendimento,
mas apenas subir como perfume...
As palavras estão gastas
e sem cor. As palavras
são suspiros ritmados,
benevolentes fantasmas
bem vestidos.
A verdadeira poesia – a invisível,
toca de leve a fímbria
dos meus versos. Mas permanece
intacta no seu mundo.
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