Sonetos*
18.
- Comparar-te com um dia de verão?
Tens mais doçura e mais amenidade:
Flores de maio, ao vento rude vão
Como o estio se vai com brevidade:
O sol às vezes em calor se exalta
Ou tem a essência de ouro sem firmeza
E o que é formoso, à formosura falta,
Por sorte ou por mudar-se a natureza.
Mas teu verão eterno brilha a ver-te
Guardando o belo que em ti permanece.
Nem a morte rirá de ensombrecer-te,
Quando em verso imortal, no tempo cresces.
Enquanto o homem respire, o olhar aqueça,
Viva o meu verso e vida te ofereça.
64.
Vendo que a mão do Tempo desfigura
a tão rica altivez dos dias idos,
Que jaz a torre em terra, das alturas
Caída, ou o bronze eterno destruído;
Vendo que o mar faminto um dia ganha
Parte ao reino da praia a quem vem dar
E no outro, o solo a àgua lhe arrebanha
E ganha à perda e perde por ganhar;
Vendo que é tão comum mudar-se o estado,
Que o próprio estado lembra uma ruína,
Eis que a ruína me tem ensinado
Que o tempo leva o amor e o amor termina.
Pensá-lo é dor mortal - pois só nos cabe
O Bem que nós tememos logo acabe.
66.
Cansado disso tudo, a morte exijo;
De ver o mérito nascido pobre
E a nulidade posta em regozijo
E a fé mais pura que a traição recobre
E a honra de ouro em vergonha aviltada
E a virtude de virgens posta à venda
E a perfeição, num erro, desgraçada
E a força ao coxo ceder na contenda
E a autoridade amordaçando a arte
E o tolo, doutoral, deitar saberes
E a verdade escarnida ao dar-se em partes
E o Bem cativo aos pés de vis poderes:
Cansado disso tudo eu me finasse
Se ao meu amor sozinho não deixasse.
(* tradução de Jorge Wanderley)
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