Desejo
Só o desejo não passa
e só deseja o que passa
e passo meu tempo inteiro
a enfrentar um só problema:
ao menos no meu poema
agarrar o passageiro.
Longe
A chuva forte, o resfriado
real ou fingido, e eis-me livre
da escola e solto no meu quarto,
nos lençóis, nos mares de Chipre
ou no salão de Ana Pavlovna
ou no de Alcínoo, nas cavernas
de Barabar ou sob a abóbada
de Xanadu; perplexo em Tebas
e pelas veredas ambíguas
do sertão do corpo da língua,
cada vez mais longe de escolas
e de peladas e de bolas
e de promessas de futuros,
é mesmo errático meu rumo.
Logrador
Você habita o próprio centro
De um coração que já foi meu
Por dentro torço pra que dentro
em pouco lá só more eu.
Livre de todos os negócios
e vícios que advêm de amar
lá seja o centro de alguns ócios
que escolherei por cultivar.
E pra que os sócios vis do amor,
rancor, dor, ódio, solidão
não mais consumam meu vigor,
amado e amor banir-se-ão
do centro ruma a um logrador
subúrbio desse coração.
Dilema
O que muito me confunde
é que no fundo de mim estou eu
e no fundo de mim estou eu.
No fundo
sei que não sou sem fim
E sou feito de um mundo imenso
Imerso num universo
que não é feito de mim
Mas mesmo isso é controverso
Se nos versos de um poema
Perverso sai o reverso.
Disperso num tal
dilema
O certo é reconhecer:
no fundo de mim
sou sem fundo.
Outros papos
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