Peliano costuma brincar que a poes-ia e foram os poetas que a trouxeram de volta! Uma de suas invenções mais ricas é conseguir por em palavras lirismos maravilhosos, aqueles que percebemos de repente e temos a impressão que não vamos conseguir exprimi-los. Exemplos: de Manoel de Barros -"Deixamos Bernardo de manhã em sua sepultura. De tarde o deserto já estava em nós"; de Ernesto Sabato - "Sólo quienes sean capaces de encarnar la utopía serán aptos para ... recuperar cuanto de humanidad hayamos perdido"; de Thiago de Mello - "Faz escuro mas eu canto"; de Helen Keller - "Nunca se deve engatinhar quando o impulso é voar"; de Millôr Fernandes - "Sim, do mundo nada se leva. Mas é formidável ter uma porção de coisas a que dizer adeus". É como teria exclamado Michelangelo que não fora ele quem esculpiu Davi, pois este já estava pronto dentro da pedra, Michelangelo apenas tirara-o de lá. Então, para Peliano, o lirismo é quando nos abraça o mundo fora de nós, cochicha seu mistério em nossos ouvidos e o pegamos com as mãos da poesia em seus muitos dedos de expressão.

Karl Marx, Fayga Ostrower e Nise da Silveira

“Antes de tudo, o trabalho é um processo de que participam o homem e a natureza, processo em que o ser humano com sua própria ação, impulsiona, regula e controla seu intercâmbio material com a natureza. Defronta-se com a natureza como uma de suas forças. Põe em movimento as forças naturais de seu corpo, braços e pernas, cabeça e mãos, a fim de apropriar-se dos recursos da natureza, imprimindo-lhes forma útil à vida humana. Atuando assim sobre a natureza externa e modificando-a, ao mesmo tempo modifica sua própria natureza. Desenvolve as potencialidades nela adormecidas e submete ao seu domínio o jogo das forças naturais. Não se trata aqui das formas instintivas, animais, de trabalho... Pressupomos o trabalho sob forma exclusivamente humana. Uma aranha executa operações semelhantes às do tecelão, e a abelha supera mais de um arquiteto ao construir sua colmeia. Mas o que distingue o pior arquiteto da melhor abelha é que ele figura na mente sua construção antes de transformá-la em realidade. No fim do processo do trabalho aparece um resultado que já existia antes idealmente na imaginação do trabalhador” (Karl Marx, O Capital, 3ª edição, Livro I, p. 202, Editora Civilização Brasileira, Rio de Janeiro, 1975).

“Criar é, basicamente, formar. É poder dar uma forma a algo novo. Em qualquer que seja o campo de atividade, trata-se, nesse ´novo´, de novas coerências que se estabelecem para a mente humana, fenômenos relacionados de modo novo e compreendidos em termos novos. O ato criador abrange, portanto, a capacidade de compreender, e esta, por sua vez, a de relacionar, ordenar, configurar, significar.
Desde as primeiras culturas, o ser humano surge dotado de um dom singular: mais do que ´homo faber´, ser fazedor, o homem é um ser formador. Ele é capaz de estabelecer relacionamentos entre os múltiplos eventos que ocorrem ao redor e dentro dele. Relacionando os eventos, ele os configura em sua experiência do viver e lhes dá um significado. Nas perguntas que o homem faz ou nas soluções que encontra, ao agir, ao imaginar, ao sonhar, sempre o homem relaciona e forma” (Fayga Ostrower, Criatividade e Processos de Criação, p. 9,  12ª edição, Editora Vozes, Petrópolis, 1977).

“O homem sempre se maravilhou de sua própria mão. Imprimiu-a nas paredes das cavernas pré-históricas em vários lugares do mundo e decerto o homem arcaico atribuía poderes mágicos a este prodigioso instrumento de ação que ele possuía e lhe permitia realizar coisas inacessíveis aos mais fores e temidos animais.
No Elogio da Mão, Henri Focillon diz que ´a posse do mundo exige uma espécie de faro tátil. Av visão desliza ao longo do universo ... A ação da mão define o vazio do espaço e o pleno das coisas que o ocupam. Superfície, volume, densidade, peso, não são fenômenos óticos. É entre os dedos, é no côncavo das mãos que o homem os conheceu primeiro. O espaço, ele o mede não com o olhar, mas com sua mão e seus passos ... Sem a mão não existe geometria, pois são necessários barras e redondos para especular as propriedades da extensão” (Nise da Silveira, Imagens do Inconsciente, p. 25, Editora Alhambra, Rio de Janeiro, 1982).

As diferentes abordagens de Marx, Fayga e Nise demonstram a importância da ação humana no trato com a natureza exterior para seu entendimento, abordagem e controle, e em especial para a criação e a formação de coisas tangíveis e intangíveis e objetos novos. O corpo humano como extensão criadora da natureza e esta como meio de trabalho e aprendizado do homem.