Peliano costuma brincar que a poes-ia e foram os poetas que a trouxeram de volta! Uma de suas invenções mais ricas é conseguir por em palavras lirismos maravilhosos, aqueles que percebemos de repente e temos a impressão que não vamos conseguir exprimi-los. Exemplos: de Manoel de Barros -"Deixamos Bernardo de manhã em sua sepultura. De tarde o deserto já estava em nós"; de Ernesto Sabato - "Sólo quienes sean capaces de encarnar la utopía serán aptos para ... recuperar cuanto de humanidad hayamos perdido"; de Thiago de Mello - "Faz escuro mas eu canto"; de Helen Keller - "Nunca se deve engatinhar quando o impulso é voar"; de Millôr Fernandes - "Sim, do mundo nada se leva. Mas é formidável ter uma porção de coisas a que dizer adeus". É como teria exclamado Michelangelo que não fora ele quem esculpiu Davi, pois este já estava pronto dentro da pedra, Michelangelo apenas tirara-o de lá. Então, para Peliano, o lirismo é quando nos abraça o mundo fora de nós, cochicha seu mistério em nossos ouvidos e o pegamos com as mãos da poesia em seus muitos dedos de expressão.

segunda-feira, 24 de setembro de 2012

Antonio Carlos Secchin

Ou
você pode me pisar
que nem confete
você pode me morder
que nem chiclete
você pode me chupar
que nem sorvete
você pode me lanhar
que nem gilete
só não pode proibir
que nem piquete
se eu quiser escapulir
que nem pivete

Luz
Le jour n’est pas plus pur que le fond de mon coeur
Racine

ao ver
o não
que sai
da dor

o som
da voz
já vai
no sim

no tom
do céu
não vi
mais luz

do que
no sol
que há
em mim

À noite
todas as palavras são pretas
todos os gatos são tardos
todos os sonhos são póstumos
todos os barcos são gélidos
à noite são os passos todos trôpegos
os músculos são sôfregos
e a máscaras, anêmicas
todos pálidos, os versos
todos os medos são pânicos
todas as frutas são pêssegos
e são pássaros todos os planos
todos os ritmos são lúbricos
são tônicos todos os gritos
todos os gozos são santos

Soneto das Luzes
Uma palavra, outra mais, e eis um verso,
doze sílabas a dizer coisa nenhuma.
Trabalho, teimo, limo, sofro e não impeço
que este quarteto seja inútil como a espuma.

Agora é hora de ter mais seriedade,
para essa rima não rumar até o inferno.
Convoco a musa, que me ri da imensidade,
mas não se cansa de acenar um não eterno.

Falar de amor, oh pastor, é o que eu queria,
porém os fados já perseguem teu poeta,
deixando apenas a promessa da poesia,

matéria bruta que não coube no terceto.
Se o deus frecheiro me lançasse a sua seta,
eu tinha a chave pra trancar este soneto.

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