Peliano costuma brincar que a poes-ia e foram os poetas que a trouxeram de volta! Uma de suas invenções mais ricas é conseguir por em palavras lirismos maravilhosos, aqueles que percebemos de repente e temos a impressão que não vamos conseguir exprimi-los. Exemplos: de Manoel de Barros -"Deixamos Bernardo de manhã em sua sepultura. De tarde o deserto já estava em nós"; de Ernesto Sabato - "Sólo quienes sean capaces de encarnar la utopía serán aptos para ... recuperar cuanto de humanidad hayamos perdido"; de Thiago de Mello - "Faz escuro mas eu canto"; de Helen Keller - "Nunca se deve engatinhar quando o impulso é voar"; de Millôr Fernandes - "Sim, do mundo nada se leva. Mas é formidável ter uma porção de coisas a que dizer adeus". É como teria exclamado Michelangelo que não fora ele quem esculpiu Davi, pois este já estava pronto dentro da pedra, Michelangelo apenas tirara-o de lá. Então, para Peliano, o lirismo é quando nos abraça o mundo fora de nós, cochicha seu mistério em nossos ouvidos e o pegamos com as mãos da poesia em seus muitos dedos de expressão.

terça-feira, 18 de dezembro de 2012

Magui Nólia


âmbar

âmbar ambas
um braço de tarde se arremete
um braço de noite se atreve
um braço de mar se intromete

âmbar ambas
a vida pára na imagem
a vida se esparrama na imagem
o olhar se inventa na imagem

âmbar ambas
ondas se propagam em cores
ondas se compõem em espelhos
cristais se enlaçam nas ondas

âmbar ambas
a gaivota traz o horizonte
a lua voa em noite cheia
o jequitibá observa na ponta dos pés

âmbar ambas
a realidade é densa
continua e não termina no gesto

atrás da manhã

a manhã estava nas primeiras gavetas do dia
vestida de cores ainda por fazer
e panos cobertos de desuso

a manhã estava era para ficar posta de lado
e eu para dela sair sem me servir
da roupa de atravessar horas a fio
e desbravar caminhos amontoados de desertos

eu não era para ficar à espreita
feito bicho anoitecido

era para varar o escuro
atrás da manhã preferida
de um sonho ainda não acabado de resistir

era para subir as paredes do dia
com as mãos aquinhoadas
de horas feitas de luzes e asas
braços da tarde

um sol retardatário
soberano, mas esmaecido, grisalho,
joga-se aos braços da tarde
estica as pernas nas nuvens
cobertas de suor, andaduras e barro
e se põe exausto, sombreado
lá no fundo de meus olhos

calor de chão
um rio de cavalos
galopa e espalma poeiras d’água
atravessa correntes de sol a pino
borbulhadas por calor de chão
e levanta vôo cego de terra batida
para tirar de pedras, sombras e pedaços de troncos
outro rio coalhado de silêncio
já seco na memória

Nenhum comentário:

Postar um comentário