Peliano costuma brincar que a poes-ia e foram os poetas que a trouxeram de volta! Uma de suas invenções mais ricas é conseguir por em palavras lirismos maravilhosos, aqueles que percebemos de repente e temos a impressão que não vamos conseguir exprimi-los. Exemplos: de Manoel de Barros -"Deixamos Bernardo de manhã em sua sepultura. De tarde o deserto já estava em nós"; de Ernesto Sabato - "Sólo quienes sean capaces de encarnar la utopía serán aptos para ... recuperar cuanto de humanidad hayamos perdido"; de Thiago de Mello - "Faz escuro mas eu canto"; de Helen Keller - "Nunca se deve engatinhar quando o impulso é voar"; de Millôr Fernandes - "Sim, do mundo nada se leva. Mas é formidável ter uma porção de coisas a que dizer adeus". É como teria exclamado Michelangelo que não fora ele quem esculpiu Davi, pois este já estava pronto dentro da pedra, Michelangelo apenas tirara-o de lá. Então, para Peliano, o lirismo é quando nos abraça o mundo fora de nós, cochicha seu mistério em nossos ouvidos e o pegamos com as mãos da poesia em seus muitos dedos de expressão.

quarta-feira, 12 de dezembro de 2012

Lu Menezes

Molde para o silêncio
 
À beira da piscina vazia
posicionadas de certo modo
três cadeiras brancas vazias
de certo modo se entreouvem
se entrefalam e entressilenciam.

 
Tsunami e vizinhança
 
Então , a mulher e a criança
seguiram uma serpente que nadou para terra firme
e conseguiram se salvar.

― A mulher
era só certa vizinha a quem, antes de morrer, a mãe
confiara a criança.

A serpente
terá sido, de repente, uma espécie de vizinha também.
― Vizinha de outra espécie.

 
Cola com anticolas
 
O make me an angle!
você aos céus implora
na cola de Dylan Thomas rogando
O make me a mask!

e na branca anticola
daquela artista paulista escovando
os dentes até não mais se ver
um pingo de rosto atrás
da máscara de pasta...

e na negra,
da cineasta belga engraxando
as botas e depois
as pernas e depois
incinerando a habitação

– Do Cosmo ao subsolo
na anticola vermelha de Cildo,
O make me an angle!
– insistes

na frente do espelho
passando o batom sem ultrapassar
limites... sem se desviar... respeitando
o contorno labial, o entorno social;
exorcizando
todo extra-artístico risco de escândalo
que algum milimétrico
impulso inoportuno possa criar
 
Distâncias incomensuráveis II
 
Grã-estrelas quebradiças
esfarelam-se na noite armazenária de um céu
com dobradiças

Muito e pouco
distam das estrelas
e da lua terra-a-terra de strass
que sobre a mesa de um camelô o sol mela

“A BBC sonhava com tudo o que eu – mas eu
só comigo sonhava!” gritou o Souza pelo oniaudiente
megafone estrelado instalado em sua mente

Pela TV se vê
que para atrair os índios, um espelho
foi deixado brilhando no matagal

Mas quem afasta
verdes feixes de elétrons
e penetra no vibrante capinzal distante

– sou eu –

índio trânsfuga que acha
a trânsfuga estrela no chão

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