Peliano costuma brincar que a poes-ia e foram os poetas que a trouxeram de volta! Uma de suas invenções mais ricas é conseguir por em palavras lirismos maravilhosos, aqueles que percebemos de repente e temos a impressão que não vamos conseguir exprimi-los. Exemplos: de Manoel de Barros -"Deixamos Bernardo de manhã em sua sepultura. De tarde o deserto já estava em nós"; de Ernesto Sabato - "Sólo quienes sean capaces de encarnar la utopía serán aptos para ... recuperar cuanto de humanidad hayamos perdido"; de Thiago de Mello - "Faz escuro mas eu canto"; de Helen Keller - "Nunca se deve engatinhar quando o impulso é voar"; de Millôr Fernandes - "Sim, do mundo nada se leva. Mas é formidável ter uma porção de coisas a que dizer adeus". É como teria exclamado Michelangelo que não fora ele quem esculpiu Davi, pois este já estava pronto dentro da pedra, Michelangelo apenas tirara-o de lá. Então, para Peliano, o lirismo é quando nos abraça o mundo fora de nós, cochicha seu mistério em nossos ouvidos e o pegamos com as mãos da poesia em seus muitos dedos de expressão.

quarta-feira, 9 de maio de 2012

Casimiro de Brito

Meus pensamentos são nómadas

Meus pensamentos são nómadas
e vagarosos

como a água que vem da montanha
e não sabe nada

do coração dos homens.
O meu, por exemplo,
tem a leveza do vento

e corre para casa como se fosse
um cão que precede
os passos do dono.

46

A guerra dos homens não inibiu
As cores do arco-íris: O mundo está pois
No seu caminho, no campo raso onde respiram
Os insetos silenciosos da morte. Os homens
Deslizam insaciáveis com o desejo
Virado para o céu. O corpo está pois
No bom caminho: A boca na terra
De quem vive apenas
Este momento.

*

Adormecer
assim: inclinado
sobre um rio
em repouso.
A mão esquerda
caída em palma
no crânio; a boca
no ombro no aroma
da pele; o joelho
e a mão direita
na coxa no canteiro ainda
molhado. Acordar assim: ouvir
o breve adágio do corpo amado
a respiração pouco a pouco mais tumultuosa
sob os lençóis subitamente visitados
pelo sol da manhã.

**


Se eu pudesse deixar de correr
Caminhava se eu pudesse deixar de caminhar
Sentava-me à sombra da nogueira azul do céu
Se eu pudesse deitar-me deitava-me
Numa cova com a forma do meu corpo em
Repouso se eu pudesse deixar de cantar
Fechava os olhos e olhava o alto vazio
Onde não acontece nada a não ser
A conciliação provisória do caos
E da luz que não se cansa de nascer.

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